Em votação unânime, o plenário do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) pediu ao Supremo Tribunal Federal (STF) que investigue o presidente Jair Bolsonaro (sem partido) por disseminação de fake news contra a urna eletrônica usada nas eleições do país. Bolsonaro tem ameaçado não realizar eleições em 2022 caso não seja implementado o comprovante em papel do voto (o chamado voto impresso).
A corte também aprovou, por unanimidade, a abertura de um inquérito administrativo sobre ataques à legitimidade das eleições.
As decisões foram tomadas na sessão que marcou a retomada dos trabalhos do TSE após o recesso de julho.
Confira abaixo perguntas e respostas sobre o que motivou as medidas da corte e as possíveis implicações para Bolsonaro, inclusive uma eventual inegibilidade.
1) O que o TSE decidiu?
São duas decisões, ambas aprovadas por unanimidade.
Uma delas é a abertura de um inquérito administrativo sobre ataques às legitimidade das eleições. O objetivo é investigar crimes de corrupção, fraude, condutas vedadas, propaganda extemporânea, abuso de poder político e econômico na realização desses ataques.
A outra é um pedido para que o STF investigue Bolsonaro sob acusação de disseminação de fake news.
O inquérito das fake news foi aberto em março de 2019, por decisão do então presidente do STF, ministro Dias Toffoli, para investigar notícias fraudulentas, ofensas e ameaças a ministros do STF. O relator da investigação é o ministro Alexandre de Moraes.
2) Quais são os motivos por trás do pedido para investigação?
Bolsonaro vem fazendo ataques constantes, sem provas, às urnas eletrônicas e ao sistema eleitoral do país.
Não se trata de algo recente. Desde as eleições de 2018, em que se sagrou vitorioso, o presidente afirma que o pleito foi fraudado.
Mas nunca apresentou qualquer evidência disso.
Na semana passada, ele fez uma transmissão ao vivo por mais de duas horas em que usou vídeos antigos de internet, já desmentidos por órgãos oficiais, e admitiu não ter provas das acusações. “Não temos provas, vou deixar bem claro, mas indícios’, disse Bolsonaro.
3) Como os ministros embasaram sua decisão?
Segundo o presidente do TSE, ministro Luís Roberto Barroso, também membro do STF, ameaçar a realização de eleições é uma “conduta antidemocrática”.
Ao apresentar seu apoio à proposta de inquérito administrativo, o ministro Alexandre de Moraes ressaltou que “com a democracia não se brinca, não se joga”.
4) O que pode acontecer com Bolsonaro?
Juristas ouvidos pela imprensa brasileira disseram que Bolsonaro corre o risco de ficar inelegível se ele for responsabilizado criminalmente a partir de investigação no inquérito das fake news ou a partir do inquérito administrativo aberto no TSE.
Mas há um longo caminho a percorrer para que isso possa acontecer.
No primeiro caso, Bolsonaro só se tornaria inelegível, ou seja, incapaz de disputar as eleições se for condenado judicialmente.
Mas essa condenação é apenas a última etapa de um processo judicial que, por sua vez, só seria aberto a partir de uma acusação formal feita pelo Ministério Público.
E mais: a tramitação desse processo requer autorização de dois terços da Câmara dos Deputados.
Já no segundo caso, o inquérito administrativo pode gerar multas na Justiça Eleitoral, além de servir como base para a contestação de um eventual registro de candidatura de Bolsonaro à reeleição — cenário também pouco provável, na opinião dos juristas.
5) O voto impresso pode substituir o voto eletrônico?
O STF já julgou o voto impresso como uma medida inconstitucional, e a ameaça de Bolsonaro de que pode não haver eleição em 2022 foi rebatida pelos chefes dos demais Poderes.
Recentemente, Bolsonaro vem atacando Barroso e afirma que, sem o voto impresso, pode não haver eleições no ano que vem.
No último fim de semana, alguns milhares de manifestantes fizeram atos a favor de Bolsonaro e do voto impresso em cidades do país. Filho de Bolsonaro, o deputado federal Eduardo Bolsonaro participou do protesto em São Paulo. Os atos têm atraído menos manifestantes que os protestos contra o presidente.
Para o ministro Luiz Fux, presidente do STF, a independência entre os Poderes não significa impunidade para atos contra as instituições. “Harmonia e independência entre os poderes não implicam impunidade de atos que exorbitem o necessário respeito às instituições”, disse Fux, em discurso na segunda-feira (2/8).
Ele afirma ainda que a população não aceita que crises sejam resolvidas de formas contrárias ao que determina a Constituição.
“O povo brasileiro jamais aceitaria que qualquer crise, por mais severa, fosse solucionada mediante mecanismos fora da Constituição”, concluiu.
Com informações da BBCBrasil